“Atrás do trio elétrico só não vai que já morreu...”. – Caetano Veloso
“Atrás do trio elétrico também vai quem já “morreu”...”.
Ao contrário do que reza o frevo de Caetano Veloso, não são somente
os “vivos” que formam a multidão de foliões que se aglomera nas ruas
das grandes cidades brasileiras ou de outras plagas onde se comemore o
Carnaval.
O Espiritismo nos esclarece que estamos o tempo
todo em companhia de uma inumerável legião de seres invisíveis,
recebendo deles boas e más influências a depender da faixa de sintonia
em que nos encontremos. Essa massa de espíritos cresce sobremaneira nos
dias de realização de festas pagãs, como é o Carnaval.
Nessas ocasiões, como grande parte das pessoas se dá aos exageros de
toda sorte, as influências nefastas se intensificam e muitos dos
encarnados se deixam dominar por espíritos maléficos, ocasionando os
tristes casos de violência criminosa, como os homicídios e suicídios,
além dos desvarios sexuais que levam à paternidade e maternidade
irresponsáveis. Se antes de compor sua famosa canção o filho de Dona
Canô tivesse conhecido o livro “Nas Fronteiras da Loucura”, ditado ao
médium Divaldo Pereira Franco pelo Espírito Manoel Philomeno de Miranda,
talvez fizesse uma letra diferente e, sensível como o poeta que é,
cuidaria de exortar os foliões “pipoca” e aqueles que engrossam os
blocos a cada ano contra os excessos de toda ordem. Mas como o tempo é o
senhor de todo entendimento, hoje Caetano é um dos muitos artistas que
pregam a paz no Carnaval, denunciando, do alto do trio elétrico, as
manifestações de violência que consegue flagrar na multidão.

No livro citado, Manoel Philomeno, que quando encarnado desempenhou
atividades médicas e espiritistas em Salvador, relata episódios
protagonizados pelo venerando Espírito Bezerra de Menezes, na condução
de equipes socorristas junto a encarnados em desequilíbrios.
Philomeno registra, dentre outros pontos de relevante interesse, o
encontro com um certo sambista desencarnado, o qual não é difícil
identificar como Noel Rosa, o poeta do bairro boêmio de Vila Isabel, no
Rio de Janeiro, muito a propósito, integrava uma dessas equipes
socorristas encarregadas de prestar atendimento espiritual durante os
dias de Carnaval.
Interessado em colher informações para a
aprendizagem própria (e nossa também!), Philomeno inquiriu Noel sobre
como este conciliava sua anterior condição de “sambista vinculado às
ações do Carnaval com a atual, longe do bulício festivo, em trabalhos de
socorro ao próximo”. Com tranquilidade, o autor de “Camisa listrada”
respondeu que em suas canções traduzia as dores e aspirações do povo,
relatando os dramas, angústias e tragédias amorosas do submundo carioca,
mas compreendeu seu fracasso ao desencarnar, despertando “sob maior
soma de amarguras, com fortes vinculações aos ambientes sórdidos, pelos
quais transitara em largas aflições”.
No entanto, a obra
musical de Noel Rosa cativara tantos corações que os bons sentimentos
despertados nas pessoas atuaram em seu favor no plano espiritual;
“Embora eu não fosse um herói, nem mesmo um homem que se desincumbira
corretamente do dever, minha memória gerou simpatias e a mensagem das
músicas provocou amizades, graças a cujo recurso fui alcançado pela
Misericórdia Divina, que me recambiou para outros sítios de tratamento e
renovação, onde despertei para realidades novas”.
Como
acontece com todo espírito calceta que por fim se rende aos imperativos
das sábias leis, Noel conseguiu, pois, descobrir
“que é sempre tempo de recomeçar e de agir”
e assim ele iniciou a composição de novos sambas, “ao compasso do bem,
com as melodias da esperança e os ritmos da paz, numa Vila de amor
infinito...”.
Entre os anos 60 e 70, Noel Rosa integrava a
plêiade de espíritos que ditaram ao médium, jornalista e escritor
espírita Jorge Rizzini a série de composições que resultou em dois
discos e apresentações em festivais de músicas mediúnicas em São Paulo.
O entendimento do Poeta da Vila quanto às ebulições momescas, é claro, também mudou:
-
“O Carnaval para mim, é passado de dor e a caridade hoje, é-me festa de
todo, dia, qual primavera que surge após inverno demorado, sombrio”.
A carne nada vale:
O Carnaval, conforme os conceitos de Bezerra de Menezes, é festa
que ainda guarda vestígios da barbárie e do primitivismo que ainda reina
entre os encarnados, marcado pelas paixões do prazer violento. Como
nosso imperativo maior é a Lei de Evolução, um dia tudo isso, todas
essas manifestações ruidosas que marcam nosso estágio de inferioridade
desaparecerão da Terra.
Em seu lugar, então, predominarão a
alegria pura, a jovialidade, a satisfação, o júbilo real, com o homem
despertando para a beleza e a arte, sem agressão nem promiscuidade. A
folia em que pontifica o Rei Momo já foi um dia a comemoração dos povos
guerreiros, festejando vitórias; foi reverência coletiva ao deus
Dionísio, na Grécia clássica, quando a festa se chamava bacanalia; na
velha Roma dos césares, fortemente marcada pelo aspecto pagão, chamou-se
saturnalia e nessas ocasiões se imolava uma vítima humana.
Na Idade Média, entretanto, é que a festividade adquiriu o conceito que
hoje apresenta, o de uma vez por ano é lícito enlouquecer, em homenagem
aos falsos deuses do vinho, das orgias, dos desvarios e dos excessos,
em suma.
Bezerra cita os estudiosos do comportamento e da
psique da atualidade, “sinceramente convencidos da necessidade de
descarregarem-se as tensões e recalques nesses dias em que a carne nada
vale, cuja primeira silaba de cada palavra compõe o verbete carnaval”.
Assim, em três ou mais dias de verdadeira loucura, as pessoas
desavisadas, se entregam ao descompromisso, exagerando nas atitudes, ao
compasso de sons febris e vapores alucinantes. Está no materialismo, que
vê o corpo, a matéria, como inicio e fim em si mesmo, a causa de tal
desregramento.
Esse comportamento afeta inclusive
aqueles que se dizem religiosos, mas não têm, em verdade, a necessária
compreensão da vida espiritual, deixando-se também enlouquecer uma vez
por ano.Processo de loucura e obsessão:
As
pessoas que se animam para a festa carnavalesca e fazem preparativos
organizando fantasias e demais apetrechos para o que consideram um
simples e sadio aproveitamento das alegrias e dos prazeres da vida, não
imaginam que, muitas vezes, estão sendo inspiradas por entidades
vinculadas às sombras. Tais espíritos, como informa Manoel Philomeno,
buscam vitimas em potencial “para alijá-las do equilíbrio, dando inicio a
processos nefandos de obsessões demoradas”.
Isso acontece
tanto com aqueles que se afinizam com os seres perturbadores, adotando
comportamento vicioso, quanto com criaturas cujas atitudes as
identificam como pessoas respeitáveis, embora sujeitas às tentações que
os prazeres mundanos representam, por também acreditarem que seja lícito
enlouquecer uma vez por ano.
Esse processo sutil de
aliciamento esclarece o autor espiritual, dá-se durante o sono, quando
os encarnados, desprendidos parcialmente do corpo físico, fazem
incursões às regiões de baixo teor vibratório, próprias das entidades
vinculadas às tramas de desespero e loucura. Os homens que assim
procedem não o fazem simplesmente atendendo aos apelos magnéticos que
atrai os espíritos desequilibrados e desses seres, mas porque a eles se
ligam pelo pensamento, “em razão das preferências que acolhem e dos
prazeres que se facultam no mundo íntimo”. Ou seja, as tendências de
cada um, e a correspondente impotência ou apatia em vencê-las, são o imã
que atrai os espíritos desequilibrados e fomentadores do desequilíbrio,
o qual, em suma, não existiria se os homens se mantivessem no firme
propósito de educar as paixões instintivas que os animalizam.
Há dois mil anos. Tal situação não difere muito dos episódios de
possessão demoníaca aos quais o Mestre Jesus era chamado a atender,
promovendo as curas “milagrosas” de que se ocupam os evangelhos.
Atualmente, temos, graças ao Espiritismo, a explicação das causas e
conseqüências desses fatos, desde que Allan Kardec fora convocado à
tarefa de codificar a Doutrina dos Espíritos. Conforme configurado na
primeira obra da Codificação – O Livro dos Espíritos -, estamos, na
Terra, quase que sob a direção das entidades invisíveis: “Os espíritos
influem sobre nossos pensamentos e ações?”, pergunta o Codificador, para
ser informado de que “a esse respeito sua (dos espíritos) influência é
maior do que credes porque, frequentemente, são eles que vos dirigem”.
Pode parecer assustador, ainda mais que se se tem os espíritos ainda
inferiorizados à conta de demônios.
Mas, do mesmo modo como
somos facilmente dominados pelos maus espíritos, quando, como já dito,
sintonizamos na mesma frequência de pensamento, também obtemos, pelo
mesmo processo, o concurso dos bons, aqueles que agem a nosso favor em
nome de Jesus. Basta, para tanto, estarmos predispostos a suas
orientações, atentos ao aviso de “orar e vigiar” que o Cristo nos deu há
dois mil anos, através do cultivo de atitudes salutares, como a prece e
a praticada caridade desinteressada. Esta última é a característica de
espíritos como Bezerra de Menezes, que em sua última encarnação fora
alcunhado de “o médico dos pobres” e hoje é reverenciado no meio
espírita como “o apóstolo da caridade no Brasil”.
Fonte:
Revista Visão Espírita.