domingo, 21 de setembro de 2014

PARTIR COM ELEGÂNCIA

Em 17 de abril de 1955,
Albert Einstein (1879-1955), o grande físico alemão, foi internado em decorrência da ruptura de um aneurisma da aorta abdominal. Anteriormente, em 1948, já havia sido operado por ameaça de problema semelhante. Fazia-se necessária nova cirurgia, com urgência, complicada e imprevisível, em face de sua idade, mas Einstein recusou-se, dizendo:
É de mau gosto ficar prolongando a vida artificialmente.
Eu fiz a minha parte, é hora de partir e vou fazê-lo com elegância.
Na manhã do dia seguinte desencarnou, aos 76 anos, após uma existência dedicada à Ciência, trabalhando sempre, até o último suspiro.
Interessante e sugestiva a expressão de Einstein: morrer com elegância.
O leitor perguntará se é possível ser elegante diante da grande ceifeira, já que as pessoas costumam agarrar-se com unhas e dentes à vida física, em bases de daqui não saio, daqui ninguém me tira.
Terminam por serem literalmente despejadas pela implacável senhora, que não dá a mínima para seus apelos, expulsando-as do corpo, a transformar-se numa casa em ruínas.
Lamentável essa inútil resistência, já que tudo o que o paciente conseguirá será prolongar a própria agonia.
Melhor, meu caro leitor, soltar-se, partir com elegância.
Na atualidade, os recursos da Medicina, extremamente sofisticados, podem prolongar a vida de um paciente terminal por dias, semanas e até meses, nas UTIs –Unidades de Terapia Intensiva.
Dificuldade para respirar?
Intubação.
Acúmulo de secreção, ameaçando sufocar o paciente?
Traqueostomia.
Não consegue comer?
Alimentação parenteral.
Rins paralisando?
Hemodiálise.
Coração fibrilando?
Eletrochoque.
Isso tudo torturando o paciente solitário na UTI, ambiente gelado, fios por todos os lados, tubos garganta adentro, dores no corpo pela imobilidade, escaras apontando, sensação de horror em momentos de despertar…Por que tal empenho, por que essa batalha inglória? Resposta simples: é para atender ao decantado respeito humano, que impõe um combate sem tréguas à indesejável senhora, mesmo sabendo que se está investindo numa causa perdida, com ônus emocionais para todos, principalmente para o paciente.
Se é terminal, por que submetê-lo a torturas inúteis?
A UTI fica bem para pacientes que podem estar correndo risco de morte em virtude de acidentes, enfartos, infecção, ou que precisem desse tipo de assistência após uma cirurgia, mas não são terminais.
Diante de um paciente idoso, câncer disseminado, prestes a sofrer uma falência múltipla dos órgãos, o médico conversou com a família:
– Se o internarmos na UTI poderemos mantê-lo vivo por algum tempo, mas em coma induzido, com toda a parafernália que ali é utilizada. O que faremos?
A família, acertadamente, optou por mantê-lo em casa.
Dois dias depois faleceu, amparado pelo carinho e a solicitude de seus entes queridos.
Veja bem leitor amigo: não se trata de abreviar a vida de um paciente, o que seria crime de eutanásia, mas de não segurar artificialmente alguém que está partindo.
Esse procedimento é hoje admitido pela Medicina, caracterizado como ortotanásia,a morte sem dor. Se o paciente é terminal, que lhe proporcionemos o conforto necessário, minorando seus padecimentos com medicação apropriada, mas suspendendo a utilização de recursos que apenas prolongarão seus padecimentos.
É algo para pensar, leitor amigo.
Se concorda comigo, será interessante conversar com familiares sobre o assunto, a fim de que, quando chegar sua vez de bater as botas, seus entes queridos superem o enganoso respeito humano, que impõe medidas desesperadas que delongam a libertação da alma. Assim você poderá retornar ao mundo espiritual de forma elegante, como Einstein.
Ricard Simonetti
Revista Reformador_setembro_2014